Como entender a evolução das infecções e a predisposição genética como fator de suscetibilidade
No manejo das infecções devem ser sempre considerados os possíveis fatores intervenientes na relação do paciente com o agente infeccioso. Considera-se uma dificuldade imunológica como algo de importância na apresentação e evolução da doença. Os imunodeprimidos devem receber um cuidado especial por parte dos profissionais da saúde, para correrem risco de vida. Esse grupo de pacientes tem características próprias que levam o cuidador a tomar condutas especiais. Uma criança com leucemia em tratamento, ao entrar em contato com o vírus da varicela deve receber cuidados especiais com a administração de soro hiperimune e medicações anti virais como medidas preventivas. Essas situações são explicitas e oferecem a oportunidade do manejo profilático. De outra parte, observamos algumas respostas as infecções que não tem explicação com o fator da. Como exemplo, a situação de três crianças hígidas, sem qualquer demonstração de problema imunitário, e que apresentam evolução de forma absolutamente diferente quando expostas a um mesmo agente infeccioso. É exemplo o caso do meningococo, que ao contaminar pessoas pode evoluir como uma simples colonização do trato superior, como uma meningite meningocócica ou ainda com uma forma fatal de meningococcemia. O agente bacteriano, e todos as demais condições, são iguais nas três situações. E como explicar? Hoje sabemos que a qualquer agressão o organismo responde com uma resposta inflamatória (RI). Essa RI segue os mesmos princípios nas diversas pessoas com a diferença de que os mecanismos de auto regulação são diferentes. A modulação da resposta inflamatória nos deixa entender essas diferenças. Os que modulam adequadamente controlam o processo infeccioso, evitando mesmo a instalação de infecção. Outro grupo de pessoas desenvolve meningite, de forma controlada. Já para acontecer uma meningococcemia fatal acontece uma resposta inflamatórias sistêmicas, com acometimento de múltiplos órgãos e freqüentemente levando ao óbito por falta de uma modulação adequada. Bem, qual a diferença entre as pessoas que fazem com que isso aconteça?
Recentemente, pesquisadores brasileiros da USP (geneticistas Mayana Zatz e Maria Rita Passos Bueno) demonstram a participação de uma predisposição genética na evolução das infecções.
Estudando nove pares de gêmeas brasileiras, nascidas de gestação com infecção pelo vírus Zika, observaram que nos 2 pares homozigotos houve a evolução para microcefalia. De outra parte entre os 7 pares de gêmeas heterozigotos apenas um par desenvolveu microcefalia. Nos demais 6, somente um dos gêmeos desenvolveu a complicação. Essa divergência sugere fatores genéticos favorecendo a evolução para uma complicação de uma infecção. Testando resposta de células neuronais dessas 6 gêmeas, foi observado que as células das que desenvolveram microcefalia se infectavam muito pelo zika vírus do que as dos que não ficaram com microcefalia.
Estudadas essas células no Instituto de Química da USP (bioquímico Sérgio Vergovski Almeida) foi demonstrado uma relação das células das afetadas para microcefalia, com menor capacidade de desenvolvimento e distribuição no cérebro, com as genes DDIT4L, FOXG1 e LHX2.
Dessa forma ?podemos entender porque algumas crianças são afetadas e outras não? diz Mayana Katz.
Para nós sobra a perspectiva do entender diferentes evoluções às infecções em pacientes higidos e sem comprometimento imunológico aparente. Esses trabalhos trazem ainda uma reflexão com relação ao tratamento das infecções, que quando sem evolução esperada são relacionadas com características do agente infeccioso ou ineficácia do antimicrobiano.
Com esse conhecimento, não temos nada resolvido, mas entendemos melhor alguns fatos na evolução das doenças infecciosas. Diferentes quadros clínicos e evolução ocasionados pelo mesmo agente infeccioso, tem explicações nas respostas dos organismos dos infectados e esse conhecimento deve ser incorporado no trabalho do dia a dia do médico.